Poemas | Hildeberto Barbosa Filho
POÉTICA II
O poema
também se faz
daquele verso
ausente,
aquele que seria
o ouro da poesia.
Aquele que vem subitamente
e nos habita à luz
da solidão.
LEGADO
À noite se segue o dia
como as águas abrigam
calor e silêncio.
Resta ao homem
a pluma da linguagem,
ásperos navios de fogo
que iluminam os vazios.
METÁFORA
Num antigo verso
falava das “pupilas da manhã”.
Hoje inverto a metáfora:
nas tuas pupilas, Pâmela, nadam
todas as manhãs.
VERÃO
É verão
e tento proteger o sol
dentro de mim.
O que me aquece,
nessa tristeza de verão,
é o frio de aço
das duras calçadas
da alma.
É verão
e as pessoas nem estão
mais alegres.
(Tudo é claro, quente, triste!)
O sol explode
dentro de mim
enquanto me despeço
das outras estações.
ESTAÇÕES
Nem no passado
me reconheço.
Sempre me perco,
quando meu passado
percorro.
No presente,
tudo vazio
tudo avesso,
morro.
No futuro,
existo e estremeço.
POÉTICA IV
Desgosto
de muitos poemas
que fiz.
Este nada me diz.
Aquele é pura mentira.
Outros, falsos brilhantes
que passam por lira.
NEGATIVO
Não me vejo
nem no espelho
nem na fotografia.
E quando me vejo,
vejo-me incompleto.
Aquele que lá está
sou eu e não sou eu
precário reflexo.
Hildeberto Barbosa Filho é poeta, cronista e crítico literário.
Membro da Academia Paraibana de Letras, é autor de diversos livros,
entre os quais Vou por aí (crônicas) e Nem morrer é remédio (poesia
reunida). Este ano lança a coletânea de poemas inéditos Dançar com
facas, pela editora Mondrongo. Vive em João Pessoa (PB).
Ilustrações André Coelho