Poema | Adriano Scandolara

Santos Dumont desaba
diante de aviões de guerra

Ilustração Marília Costa
Ilustração Marília Costa

o coração nunca gera ódio
a língua é que gera ódio
Provérbio sumério

Água ou sol
demais ou menos, fungo, ferrugem
nas folhas, macega, roedores,

em cada
reino de ser vivo
uma praga
o solo mesmo como funcionário
em seu cubículo
exaurido:
motivos
tantos por trás do
preço alto do trigo,
da banana, as maçãs
bichadas
e porque tudo
o que o homem semear,
isso também ceifará,
logo se nota que mau agricultor
era Paulo de Tarso
sim, teve exceções, inventores do touro                                                                                                      
de bronze, da guilhotina,
no mais porém convém
corrigir os mitos:
o fogo
roubado em nada abalou o sono dos deuses
prevendo antes do uso benéfico
gritos, fumaça preta,
aldeias incendiadas
mas que frente ao horror
em vez de
enterrarmos o fogo com os outros
indícios de que tomamos o caminho errado,
a língua odiosa, o cálculo
da balística e construção de bombas,
continuaríamos
sem retorno ou olhar pra trás
no mesmo caminho, isso
eles não previram.

Adriano Scandolara é poeta e tradutor. Em 2015 traduziu, para a editora Autêntica, o livro Prometeu desacorrentado e outros poemas, do poeta inglês P. B. Shelley. Scandolara é autor dos livros de poesia Lira de lixo (Patuá, 2013) e PARSONA (Kotter, 2015). Também é coeditor da revista dedicada a traduções escamandro. Vive em Curitiba (PR).