Poema | Ademir Demarchi

1001 poetas
Poetariado à rollmops


para o dalton

de todas as seitas
esta santa ceia
das tantas ceifas
do celeiro nacional
poeta local
a dar com pau
querendo ser federal
universal e sideral
os gralhas
os pés roxos
e os tralhas
os sãos
os que são
e os que acham que são
os coxos
os mochos
e os pelancas
os encardidos
os pobres
os fudidos
e os enrustidos
os ressentidos
os miseráveis
e os reprimidos
os impublicados
e os impublicáveis
os mal-amados
e os desgraçados
as poetinhas amantes
de poetastros diletantes
os petulantes
os donos da verdade
e os comidos pela vaidade
os com mania de perseguidos


os que se acham
injustiçados
os gênios incompreendidos
os que adoram saraus
os lacraus
e os balandraus
os moscas azuis
os das seita ai jesuis
os pentelhos
os pés vermelhos
os coxas brancas
os atleticanos
e os que entraram pelo cano
os tubarões e os do tubarão
os galos e os do galo
os cornados
os descornados
e os corneados
os bicudos
os embicados
os peludos
e os despelados
os franguinhos
e os pavões
os ainda nos ninhos
os alazões
e os pangarés
os que são pais
os que são filhos
os afiliados
e os desfiliados
os pederastas
os gays os trans
os performáticos


e os asmáticos
os curitibocas
e os curitibanos
os punks
os pardais
e os sem pés
os da artilharia
e os da maçonaria
as cotovias
da geriatria
as andorinhas
da feirinha
e da barreirinha
os empombados
e bem apessoados
os que têm biblioteca
os que frequentam a biblioteca
os que odeiam a biblioteca
os que furtam livros
os que dizem ter lido
os pretensiosos
e os adiposos
os lisos
e os encorungados
os com fígado no cérebro
os que babam bílis
e os que têm olhos vidrados
os cegos
e os de acorcundados egos
os que viraram estátua
os que amam estátuas
os que esperam virar busto
e os que não acham justo
os que se ocultam atrás de arbustos


os que ficam em cima do muro
e os sem futuro
os iluminados
e os luminescentes
os tarados
e os indecentes
os parricidas incestuosos
os gays e os tortuosos
os sushis e as sashimis
os haicaístas
os parasitas
os narcisistas
os masoquistas
os perfeccionistas
os paranistas
e os onanistas
os polacos e os catarinas
os anarquistas e os das vinas
as das rimas e sinônimas de vagina
sonhando com os pinheiros
e os carvalhos prontas pra casar
com o primeiro amoreira e o primeiro pereira
e os pinheiros e os carvalhos
sonhando com a casa do caralho
os de posse
e os que tomam posse
os stalinistas
os idealistas
e os groucho-marxistas
as prostitutas japonesas
as helenas
e as sapatas
os que se levam a sério
e os que parecem vitupério


os maníacos
e os hipocondríacos
os neo simbolistas
os macumbeiros
os templários
os adoradores de shiva
os amantes de pica e das próprias picas
os à procura de crica
os ex-hippies
e os ripongos
os etno
parasitas
e os tecno
concretistas
os caipiras
os carpideiras
os choradeira
os caprinos
os muares
os galinha
e os fim de linha
os Poetas
e os profetas
os flores
os condores e
os com dores
os trovadores
e os cantores
os da adula
os caçula
e os toddynho
os mágicos
e os trágicos
os poetas-tang


os coca
os coca-cola
e os que dão bola
os danoninhos
os daltonianos
os daltônicos
os karanianos
os penianos
os leminskianos
os snegianos
os valencianos
os venusianos
os kolodyanos
os sossellianos
os martinianos
los buenanos
os nanos
os odisseus
e os fariseus
os religiosos
e os pecaminosos ateus
os alcoólatras
os pedólatras
os lolitas
os da academia
e os da polissemia
as esposas
as mariposas
as viúvas
e as que viram a uva
as mal amadas
as de vaginas mal faladas
as faladeiras e as encrenqueiras
os de longos pavios


e os de pavio curto
os sem navio
e os que ficam a ver navios
os carecas de cocoruto
e os pouca telha
que escrevem o que dá na telha
os que ouviram sereia
os que viram disco voador
e os que papam mingau de aveia
os poetas dos cafezais
e dos pinheirais
da terra roxa
e dos litorais
das cabrochas
e dos bananais
dos campos gerais
e das fronteiras de ais
do interior e da capital
os que estão em antologia
e os que não estão
tantos que deglutidos
já me fazem mal
vão ser todos regurgitados
e, ó, chamando o ugo
vou logo me livrar desse vulgo
penso não consigo
que seja isso sonho
prostrado que estou enfadonho
acordado como cascudo inseto
e cercado de dejetos
sendo comido de asia
na vã cama da poesia


Ademir Demarchi nasceu em Maringá (PR). É autor, entre outros, dos livros de poemas Os mortos na sala de jantar (2007) e Pirão de sereia (2012). Organizou o livro 101 poetas paranaenses — antologia de escritas poéticas do século XIX ao XXI (2014), publicado pela Biblioteca Pública do Paraná. Vive em Santos (SP).