Na biblioteca de Nadja Naira

Experimentalismo na estante

O acervo da atriz, diretora e iluminadora Nadja Naira é cuidadosamente escolhido e reúne obras de autores que apostaram na linguagem e viveram no Paraná, como Manoel Carlos Karam, Wilson Bueno e Paulo Leminski

das


Helena Salvador


A biblioteca de Nadja Naira é modesta, ocupa apenas uma estante no canto de sua sala de estar. Mas a atriz da Companhia Brasileira de Teatro se orgulha de ter montado “uma biblioteca leve e cheia de personalidade”. Cada livro é marcado com a sua “logo”, um carimbo de madeira esculpido pela artista plástica curitibana Ana González. 
A maior parte do acervo (cerca de 200 títulos) tem alguma relação com o trabalho artístico de Nadja — vão de livros teóricos sobre iluminação de palco até originais de Manoel Carlos Karam. Aliás, a obra do romancista catarinense que fez carreira em Curitiba tem lugar de destaque na biblioteca da atriz. Karam faz parte de um seleto grupo de escritores cujos livros foram levados aos palcos pela Companhia Brasileira de Teatro. 

Nos últimos anos de vida de Karam (1947-2007), Nadja pôde conviver mais proximamente com o autor, que durante os anos 1970 teve intensa produção teatral e só na década seguinte migrou para os livros. Essa proximidade fez com que Karam confiasse à amiga não apenas alguns de seus originais, mas também diversos textos inéditos para teatro, como A cidade sem mar, levado aos palcos em 2016. 

Os livros de Karam, assim como os de outros autores do acervo, costumam receber intervenções de Nadja, que tem um método de leitura minucioso, faz anotações e cometários nas obras. Desde pequena a atriz, que nasceu em Castro (PR), sofre de uma leve dislexia. Isso a forçou a fazer leituras em voz alta — o que acabou ajudando em seu trabalho dramático. 

Formada no curso superior de Artes Cênicas da PUCPR, Nadja tem relação próxima com a obra de autores paranaenses. Como diretora, além de Karam, levou aos palcos textos de Wilson Bueno (Mar paraguayo). Junto com a Companhia Brasileira de Teatro, participou da aclamada montagem de Vida (2010), peça sobre o universo literário de Paulo Leminski, com especial destaque ao romance experimental Catatau. 

Sobre a literatura curitibana, Nadja acredita que a produção dos autores locais tem uma “natureza distinta”, derivada do “exílio” vivido pelos escritores curitibanos em relação ao restante do país. “Tem algo de punk ou underground no humor curitibano, que vem dessa solidão em que vivemos. É diferente daquilo que se produz em outros Estados”, opina.


Ulisses (1922), 
de James Joyce

jhg

 “O trecho final do monólogo de Molly Bloom não tem uma vírgula nem um ponto. Tem coisa mais gostosa que ler sem saber onde começa e onde termina uma frase? Essa é uma oportunidade incrível para deixar-se envolver com um texto.” 


Persépolis (2007), 
de Marjane Satrapi

klj


“Desde pequena eu gosto de inventar histórias para os quadrinhos, não seguindo exatamente o texto. Persépolis é um livro bonito e isso me agrada.” 


Mar paraguayo (1992),
de Wilson Bueno 

hyuhy

“Pela dificuldade de ler o texto, me interessei por Mar paraguayo. Inclusive, ajudei a adaptá-lo para o teatro. Para mim, Mar paraguayo é um marco da ligação entre o teatro e a literatura paranaense.”


Catatau (1975),
de Paulo Leminski 

j

“A leitura de Catatau veio dos estudos da peça Vida, que conta a trajetória do Leminski. O romance é uma bagunça que, de alguma maneira, faz muito sentido.”

O impostor no baile de máscaras (1992),
 de Manoel Carlos Karam 

jk

“Karam faz as histórias do cotidiano da gente comum virarem um conto fantástico. Esse é sobre o pessoal do teatro e especialmente me encanta.” 

O jogo da amarelinha (1963), 
de Julio Cortázar

jbh

“Esse é o meu livro perfeito, você pode lê-lo do jeito que quiser, ele apenas dá orientações de possíveis caminhos de leitura.” 


Com que se pode jogar (2011),
de Luci Collin 

uh

“Justamente por culpa da minha dinâmica de leitura, acabo apreciando com muita demora os livros que leio. Esse, porém, é uma exceção. Li Com que se pode jogar em uma noite, de tanto que me identifiquei com as experimentações envolventes da Luci Collin.”