Poesia
Conjunto habitacional Esperança
Ap. 925 – Bloco E
dentro de sete dias
serei despejado
deste amplo apartamento
de vinte metros quadrados
puta sacanagem
perder esta janela
sem sol
ou paisagem
fora os nove lances
de escada
e as pastilhas
que se jogam
da fachada
(desperdício
ou
suicídio?)
ficar sem o mofo
as infiltrações as pulgas
e esta bela vista
do fosso
que recolhe toda a chuva
para irrigar
minhas rugas
Susana em dois tempos
1.
da última vez que a vi
ela estava com pressa
mal me cumprimentou disse
que andava a mil
horas depois
tomou meia garrafa
de vodca
e três caixas
de rivotril
2.
era alta
magra
e (segundo
dizia)
bem resolvida
embora seja impossível
cá entre nós
resolver
a vida
Condessa Petrina Marzano
turbinou a bunda
melhorou a silhueta
com 300 ml
em cada teta
trocou de dieta
alcançou com botox
a antiga meta
depois de 23 cirurgias
na pele crivada
de setas
sacou duas costelas
e esticou o couro
até as canelas
bem que ficou natural
seu jeito de chorar
sem mudar o visual
apenas
por sequela
quando explode aquele riso
(aquele riso
que desgoverna)
ela levanta
ligeiramente
a perna
Pausa
meu olhar despenca
desta
até outra sala
e dessa
na memória
até a fala
que há muito
se perdeu
no puro breu
de um voo
sem escalas
Ap. 925 – Bloco E
dentro de sete dias
serei despejado
deste amplo apartamento
de vinte metros quadrados
puta sacanagem
perder esta janela
sem sol
ou paisagem
fora os nove lances
de escada
e as pastilhas
que se jogam
da fachada
(desperdício
ou
suicídio?)
ficar sem o mofo
as infiltrações as pulgas
e esta bela vista
do fosso
que recolhe toda a chuva
para irrigar
minhas rugas
Susana em dois tempos
1.
da última vez que a vi
ela estava com pressa
mal me cumprimentou disse
que andava a mil
horas depois
tomou meia garrafa
de vodca
e três caixas
de rivotril
2.
era alta
magra
e (segundo
dizia)
bem resolvida
embora seja impossível
cá entre nós
resolver
a vida
Condessa Petrina Marzano
turbinou a bunda
melhorou a silhueta
com 300 ml
em cada teta
trocou de dieta
alcançou com botox
a antiga meta
depois de 23 cirurgias
na pele crivada
de setas
sacou duas costelas
e esticou o couro
até as canelas
bem que ficou natural
seu jeito de chorar
sem mudar o visual
apenas
por sequela
quando explode aquele riso
(aquele riso
que desgoverna)
ela levanta
ligeiramente
a perna
Pausa
meu olhar despenca
desta
até outra sala
e dessa
na memória
até a fala
que há muito
se perdeu
no puro breu
de um voo
sem escalas
Iacyr Anderson Freitas é poeta, mestre em Teoria da Literatura pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Publicou mais de dez livros, entre poesia, prosa e ensaios. Já recebeu diversos prêmios literários nacionais e é publicado em pelo menos outros oito países. Entre suas principais obras estão Trinca dos traídos (2003) e Oceano coligido (2000). Vive em Juiz de Fora (MG).
Ilustração: Marciel Conrado
Ilustração: Marciel Conrado