Poema | Reynaldo Damazio

Biscates


Bolaño escrevia poemas
             mas a prosa o consagrou
na fina tela que o cigarro erguia
             no ar
imagens assassinas loucos suicidas
             putinhas safadas faziam boquete
no meganha filho da puta, redundâncias,
            em troca de pó e de dar no pé
a vida real sempre fica pelo acostamento
             Ulisses aceita bico num camping
de olho na garçonete tetuda
             um bom prato de comida
talvez valha mais que três páginas
             de um conto medíocre
mas o diabo é que a alma quer literatura
             ficções livros de areia
mercado de pulgas explodindo na mente
             cães que se erguem nos pelos e
uivam por Leopardi, ao humano ao divino,
             como sangue coagulado no
bloco de notas, caninos cravados no
             desassossego
ossos trincados de tanto frio, ressacas,
             a rua é o livro, pessoa ou pessoas,
quiçá.


Reynaldo Damazio é editor, crítico literário, poeta e coordenador do Centro de Apoio ao Escritor da Casa das Rosas. Autor de Horas perplexas e organizador, com Tarso de Melo, de Literatura e cidadania, entre outros. Vive em São Paulo (SP).