Editorial - Cândido 94

O clássico 1984, do escritor inglês George Orwell (1903- 1950), completa 70 anos em 2019. Aproveitando a efeméride, o Cândido convidou Ignácio de Loyola Brandão para escrever sobre o romance. Mas o recém-imortal da Academia Brasileira de Letras fez mais do que uma simples análise. Foi além. Em texto com a verve que marca seus melhores momentos na ficção, o autor de Zero (1974) relaciona alguns dos temas mais urgentes levantados em 1984 (repressão, manipulação de informação, vigilância do Estado) com o momento vivido no Brasil e no mundo, onde em muitos sentidos a ficção de Orwell se torna cada vez mais real.
“E quando vejo a vida idealizada naquele que ainda é um dos romances mais assustadores que já li?”, pergunta o autor do também clássico Não verás país nenhum (1982), romance que bebe na fonte do próprio 1984 e de outras obras emblemáticas, como Admirável mundo novo (1932), de Aldous Huxley.

A trajetória pessoal do autor de A revolução dos bichos (1945) também ganha espaço. Um perfil biográfico mostra como Orwell, que morreu de tuberculose aos 46 anos e cujo nome real era Eric Arthur Blair, teve uma existência meteórica e intensa: foi funcionário da Polícia Imperial Indiana, lavador de pratos em Paris, jornalista da BBC e soldado voluntário na Guerra Civil Espanhola (1936-1939) — onde levou um tiro na garganta.

O Cândido também resgata um texto do escritor e jornalista Sérgio Augusto que relaciona a repressão sexual em Oceânia, o país onde se passa 1984, com as ideias do psicanalista alemão Wilhelm Reich e seu livro A psicologia de massas do fascismo (1933). O texto de Augusto foi originalmente publicado em 1984 na Folha de S.Paulo e revisto pelo autor para esta edição.

Na coluna Pensata, o professor de Literatura Comparada da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) João Cezar de Castro Rocha, autor de Exercícios críticos: Leituras do contemporâneo (2008) e Machado de Assis: Por uma poética da emulação (2013), discute os caminhos da crítica literária em tempos de internet e redes sociais. Já o escritor paranaense Domingos Pellegrini comenta a relevância de Os sertões (1902), clássico de Euclides da Cunha, nos dias de hoje. Outro grande escritor, o americano Kurt Vonnegut, tem sua trajetória revista em reportagem do jornalista e editor Omar Godoy. O autor de Café da manhã dos campeões (1973) tem sua obra novamente valorizada no Brasil, com a recente publicação de livros importantes, como Matadouro-cinco.

O fotógrafo Eduardo Macarios apresenta imagens da mostra Por dentro da Biblioteca, com fotos da Biblioteca Pública do Paraná que exploram o projeto arquitetônico do interior do prédio e evidenciam o contraste entre o antigo e o moderno na BPP, instituição que em março completou 162 anos.

Outro destaque é a transcrição do bate-papo com o escritor e jornalista Sérgio Rodrigues (foto), que abriu a temporada 2019 do projeto Um Escritor na Biblioteca. Na conversa, o romancista fala sobre o desenvolvimento de alguns de seus livros, como O drible (2013) e Elza, a garota (reeditado em 2018), além de comentar temas como o futebol na literatura e o espaço que os autores de ficção têm hoje na cultura brasileira.

Entre os inéditos, a edição traz poemas de Rodrigo Tadeu Gonçalves, Yasmin Nigri e Marina Colasanti — que em agosto lança novo livro de poesia —, além de conto de Bernardo Ajzenberg e fragmento do próximo romance de Guido Viaro, o 15º da carreira do escritor curitibano. A ilustração da capa é do artista Visca.

Boa leitura!