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Curitiba

A redação do Cândido funciona em uma sala da Biblioteca Pública do Paraná, localizada na região central de Curitiba. Portanto, é natural que a capital paranaense e sua cena literária sejam assuntos frequentes de suas páginas. Não à toa, uma das seções mais duradouras do jornal, Em Busca de Curitiba, trazia contos inéditos ambientados na cidade. Foram mais de 30 textos publicados entre 2012 e 2015, de nomes como Luci Collin, Luís Henrique Pellanda, Márcia Denser, Luiz Felipe Leprevost, Cezar Tridapalli, Carlos Machado, Mariana Sanchez, Otavio Linhares e Guido Viaro, entre outros

“Dois aspectos históricos demonstram que Curitiba nasceu para o conceito de grupo. O primeiro é seu nome. Como explica o filólogo argentino Juan Ruflo, a etimologia é reveladora: em guarani ‘Curi’i’ significa ‘pinheiros’, ‘tib’ é um verbo existencial e ‘ba’ é um locativo traduzível por ‘lugar onde naturalmente se reúnem muitos’; em tupi, ‘coré’ seria ‘pinheiros’ e ‘etuba’ indicaria ‘ajuntamento’ — Curitiba é, portanto, uma ‘tribo de pinheiros’. O segundo aspecto remonta aos caingangues, nossos primeiros habitantes. Conforme o historiador sérvio Evilásio Afrânio, este povo, que já conhecia as Sagradas Escrituras (transmitidas pelos tcharuitecas do Suriname, que desceram até a bacia do Belém), identificando-se com a causa do personagem bíblico Cain, teria formado, então, a primeira gangue curitibana de que se teve notícia. Vale lembrar que foi do líder caingangue Xim’biica a famosa frase sobre Coré Etuba: ‘Tá! Tati Kéva! Ha Kantin!’ (‘Aqui! Aqui ó, é o lugar! Vinde!’) usada para indicar o local ideal à construção do Trevo do Atuba (posteriormente Cidade de Curitiba). Diz a lenda que, neste momento, a estátua de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais sorriu em aprovação ao sítio escolhido.”

Trecho de “CORÉ ETUBA: TATI KÉVA!”, conto de Luci Collin, com ilustração de Marciel Conrado (edição 14, setembro de 2012)
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Marciel Conrado

“A vida como um horizonte monótono entre um porre e uma ressaca. A minha vida com Alvim, o meu amor por Alvim: nossas bebedeiras siderúrgicas. Evidentemente, aos 22 anos — como a temperatura nos jatos da Varig (que aliás não existe mais) — eu não tinha nenhum espírito crítico. Apenas uma cega voracidade imensa de viver. Que hoje, aos 60, perdi completamente, restando apenas a lembrança duma vida não vivida, antes consumida cegamente. De modo que não se entristeça, Curitiba, se não te curti devidamente, posto que, à mesma logística dispensada ao Rio, Cabo Frio, Campos do Jordão e Buenos Aires, você se incorporou passivamente como mais uma cidade sem rosto e sem alma para além da confortável curtição cinco estrelas à la carte da primeira classe presente em todos os jatos da Varig (que aliás não existe mais).”
Trecho “Curtir Curitiba (Desmemória)”, conto de Márcia Denser, com ilustração de Fulvio Pacheco (edição 36, julho de 2014)
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Fulvio Pacheco
“Depois da Vila Sandra o ônibus entrava na Ecoville, torres luxuosas para famílias bonitas e felizes, era isso o que os folhetos promocionais davam a entender. Os prédios tinham quase todos nomes franceses, a arquitetura era cópia de vários estilos, e também copiava estilos já copiados, uma grande salada de nabos sem sal, repleta de imensas janelas de vidro, onde, por alguns instantes, quem viajava de ônibus poderia ver um pouco daquilo que jamais teria. As estações-tubo completavam a refeição insossa, pareciam solitários emblemas da modernidade perdidos entre grandes terrenos baldios e porções de concreto cercadas por fios elétricos.”

Trecho de “Benjamin Vermelho”, conto de Guido Viaro, com ilustração de Rafa Campos (edição 18, janeiro de 2013)

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Rafael Campos Rocha