ESPECIAL | Sem fórmulas prontas 30/01/2023 - 16:37

Com propostas e estratégias diferentes das adotadas pelas editoras tradicionais, selos menores ampliam sua presença na imprensa e nas premiações

Isabella Serena e Juliana Sehn

 

Daniel Lameira lembra que os avanços tecnológicos e a popularização dos meios digitais ampliaram o acesso ao mundo editorial. Hoje, uma pequena editora (ou mesmo um autor independente) consegue deixar seus livros disponíveis para os leitores em questão de horas. Também é possível encontrar parceiros que viabilizam edições físicas sob demanda e, muitas vezes, criam estratégias de marketing digital tão eficientes quanto as desenvolvidas por grandes editoras.

Ele também observa que, embora a publicação por empresas tradicionais ainda seja um diferencial, muitos autores têm optado por se manterem independentes. Ou fazem o caminho contrário, deixando as editoras estabelecidas para apostar em selos que conectem suas obras diretamente com o público-alvo. “Muitas vezes, as editoras independentes conseguem ter visões e propostas mais ágeis e interessantes”, diz.

Lameira observa que esse processo vem se refletindo nos prêmios literários, cada vez mais abertos aos indies — inclusive considerando proporcionalmente a quantidade de livros lançados. Em 2020, por exemplo, as editoras “menores” foram finalistas de mais de 40% das premiações nacionais, segundo uma pesquisa do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul (IFRS).

Exemplos não faltam. A curitibana Jéssica Iancoski criou o podcast Toma Aí Um Poema em 2020 e começou a publicar livros pelo selo homônimo no ano seguinte. Em 2022, foi finalista do Jabuti com A Pele da Pitanga — Luiza Romão levou o prêmio com o livro Também Guardamos Pedras Aqui, da editora Nós. Na categoria Contos, Eliane Alvez Cruz foi vencedora com A Vestida, publicado pela Malê. O prêmio Machado de Assis para romances, da Biblioteca Nacional, foi entregue ao livro Siameses, de Antonio Geraldo Figueiredo, que saiu pela Kotter. Já a editora Patuá teve títulos entre os finalistas do Oceanos e do Prêmio São Paulo de Literatura.

Guilherme Pereira também acredita que o segmento independente tem crescido no que se refere ao apoio mútuo entre as editoras, que organizam eventos, movimentam uma cadeia produtiva e vêm ganhando mais espaço na mídia especializada.

Para João Varella, por trás desse boom há toda uma conjuntura, que inclui o fato de que o negócio do livro é cada vez mais desinteressante para grandes estruturas, uma vez que faz circular pouco dinheiro. Não à toa, os grandes do ramo têm se limitado a utilizar fórmulas já testadas e apostar em best-sellers.

Enquanto isso, as editoras independentes fazem um trabalho mais próximo do autor e, muitas vezes, mais local, artístico e criativo. “A gente sente que esse é o jeito que a literatura deve se portar. Buscamos fazer livros significativos e que explorem a sua materialidade. Em um livro convencional, já existe uma fórmula pronta. Aqui, você precisa pedir que a máquina da gráfica faça o que ela não foi programada para fazer”, conclui Varella.