Poema | Antonio Cicero 17/03/2020 - 14:47

O grito

Estou acorrentado a este penhasco
logo eu que roubei o fogo dos céus.
Há muito tempo sei que este penhasco
não existe, como tampouco há um deus
a me punir, mas sigo acorrentado.
Aguardam-me amplos caminhos no mar
e urbes formigantes a engendrar
cruzamentos febris e inopinados.
Artur diz “claro” e recomenda um amigo
que parcela pacotes de excursões.
Abutres devoram-me as decisões
e uma ponta do fígado mas digo:
E daí? Dia desses com um só grito
eu estraçalho todos os grilhões.

 

ANTONIO CICERO nasceu no Rio de Janeiro (RJ), em 1954. Formado em Filosofia pela Universidade de Londres, ocupa a cadeira 27 da Academia Brasileira de Letras desde 2017. Poeta, letrista e ensaísta, é autor dos versos de Porventura (2012) e dos ensaios de A Poesia e a Crítica (2017), entre outros. O poema publicado pelo Cândido faz parte da antologia Estranha Alquimia, que será lançada pela editora Penalux ainda neste mês.