Memória

Cachorro não, Chichorro

Alceu Chichorro (1896-1977) foi uma celebridade na capital paranaense por sua atuação crítica na imprensa como fotógrafo, jornalista e, principalmente, chargista


Lucas de Lavor
Reprodução
Segundo o cronista Dante Mendonça, Alceu Chichorro (1896-1977) foi o mais relevante chargista da imprensa curitibana: “Era um popstar”, afirma.

Segundo o cronista Dante Mendonça, Alceu Chichorro (1896-1977) foi o mais relevante chargista da imprensa curitibana: “Era um popstar”, afirma.

Curitiba tem uma tradição de desenhistas, entre os quais se destacam Poty Lazzarotto (1924-1998), Oswaldo Miranda (Miran), Paixão, Solda, Retamozzo e Alceu Chichorro (1896-1977). Em texto publicado no jornal Gazeta do Povo, o escritor e cineasta Valêncio Xavier definiu o trabalho de chargista de Chichorro como “um dos melhores que este país já teve”. O jornalista, escritor e cronista Dante Mendonça conta que Chichorro foi uma figura pública muito conhecida em Curitiba. “Ele era tão popular, mais popular que jogador de futebol, quanto um locutor de rádio na época. Era um popstar”, afirma Mendonça. 

Chichorro assinava livros como Eloy de Montalvão e charges como Eloy — ele atuou no jornal O Dia, um dos mais importantes diários da capital paranaense durante parte do século XX. A relevância de Chichorro para a cultura do Paraná, comenta Dante Mendonça, diz respeito ao fato de ele ter sido atuante na imprensa, sobretudo durante o Estado Novo — o chargista quase foi preso entre as décadas de 1940 e Segundo o cronista Dante Mendonça, Alceu Chichorro (1896-1977) foi o mais relevante chargista da imprensa curitibana: “Era um popstar”, afirma. 1950. “Ele era anti-getulista e fazia um humor que encontrava ressonância nos leitores. Não tinha medo de se expôr e parecia ser muito honesto com ele mesmo”, diz Mendonça. 

A diretora cultural do Museu Oscar Niemeyer, Estela Sandrini, lembra de conferir nas páginas do jornal O Dia as charges do Chichorro. “Os leitores curitibanos esperavam para ver o desenho do Chichorro, que fazia crítica política, mas também retratava o comportamento da sociedade”, observa Estela, também artista plástica — o pai dela, José Ernesto Erichsen Pereira (1909-1964), foi diretor de O Dia e amigo de Chichorro. 

2


Um dos personagens mais conhecidos criado por Chichorro, o Chico Fumaça, era uma sensação na imprensa curitibana. O Chico Fumaça, sempre acompanhado do cachorrinho Totó, lembrava, de acordo com Estela Sandrini, o Amigo da Onça, personagem criado pelo desenhista Péricles de Andrade Maranhão (1924-1961), sucesso da revista O Cruzeiro. “O Chico Fumaça era esperado por todos, a cada nova edição do jornal. Existia uma sequência no trabalho do Chichorro, talvez por isso ele tenha marcado tanto”, completa Estela. 

Formação e cultura 

No início do século XX, Chichorro teve aulas com Alfredo Andersen (1860- 1935), norueguês radicado em Curitiba, pintor, escultor, desenhista e professor, responsável por formar uma geração de artistas e que, devido a essa atitude, é considerado o “pai da pintura paranaense”. Filho de Francisca Hosana Rodrigues e do jornalista Joaquim Procópio Pinto Chichorro Júnior, demonstrou ainda menino interesse pela imprensa.

Chichorro colaborou com as revistas Pomba e Olho da rua e os jornais O Anzol e Gazeta do Povo, mas foi mesmo nas páginas de O Dia que se afirmou. O jornalista e escritor Wilson Bóia (1927- 2005), no livro Álbum de Charges de Alceu Chichorro, publicado pela Secretaria de Estado de Cultura do Paraná (Seec), cita alguns dos principais personagens criados pelo artista, entre os quais Tancredo, Pascoalino, Minervino, Chico Fumaça, Tia Marcolina e Dona Anunciata. 

Mas foi mesmo com o já citado Chico Fumaça que Chichorro se destacou. Bóia fez uma definição do personagem: “O patrono do povo, sufocado pelas artimanhas da política, o advogado implacável, a lutar, com unhas e dentes — mas sempre com uma pitada de sal e de inteligência — pela moralização dos costumes e pelo respeito às instituições.” Dante Mendonça acrescenta que Chico Fumaça não era politicamente correto e que, hoje, o cachorro Totó, “que apanhava constantemente, poderia fazer com que a Sociedade Protetora dos Animais viesse a causar problemas para Chichorro”. 

Em 1958, ele se aposentaria dos Correios e Telégrafos, empresa onde trabalhou durante 34 anos — desde 1924. Dois anos depois, publicou o livro de poemas Quando caem as trevas e, em 1964, a coletânea de crônicas Mulheres e mais mulheres. Após 48 anos dedicação à imprensa paranaense, aposentou-se como jornalista em 1961. “O Chichorro foi o chargista mais importante da história do Paraná”, comenta Dante Mendonça. Faleceu em 1977, aos 81 anos — em 2005, aconteceu o lançamento de Cachorro não, Chichorro!, documentário sobre o chargista, de 15 minutos, dirigido por Arnoldo e Paulo Friebe.