TRADUÇÃO | Leonel Lienlaf 31/07/2023 - 16:08

O rio do céu

 

O imenso rio do céu

adormeceu no meio de seu leito;

em suas águas as almas de meus antepassados

se reanimam.

 

A terra mergulha

no rio do céu;

entra em suas águas claras,

águas altas,

seja em noite estrelada, ou de lua,

ou em noite de frio.

 

O rio adormeceu,

virou um remanso

que aguarda as águas de nossas

almas.

 

O imenso rio do céu dorme

e me aguarda.

 

 

Wenumapu leufü

 

Wenumapu leufü

umagtuy rangin rüpü

kallfüwenu laefüko

witru-witrungey.

Feymew füchkütukey

ñi füchakecheyem,

ka müñetukey tüfachi mapu

ñi lifkomew,

wenuko

kiñe alengechi trafuya,

kiñe chokon trafuyamew.

 

Ti leufü umagkünowi

Wenumapu leufü kanchatumekey.

 

***

Confusão

 

Um sol violeta se levanta, posso vê-lo,

vejo minhas mãos azuis,

as flores úmidas que caem sobre mim.

Meus olhos fogem, vejo,

vejo essas mãos que se perdem

              ao segui-los,

e meus pés arrancados

que lançam por terra

um corpo estarrecido.

 

Meu pensamento vaga

em busca de minha mente,

entre paredes de edifícios

iluminados, frios.

Minha boca corre atrás de suas palavras

fugitivas, e eu aqui

sem nada, sem entender nada.

 

Wed-weden kiñe antü

 

Kiñe kallfü antü pen

kallfüwey ina ñu kuwü

ka fochon tapül ñi kachillmew nagy.

Lefi ta ñi nge,

ñi kuwü inatukueyew,

ka ñi namum leftripalu

gütrüfkünoy ñi kalül.

 

Ñi rakiduam amuñkeavi

kintupelu ñi lonko enkellmew.

Füchakeruka enkellmew.

Ñi wün inaniefi ti dungu

lefi yengün wayunpüle

ina inche tüfamew mülen

kimnokechy.

 

 

 

 

O poeta mapuche Leonel Lienlaf nasceu em Alepue, Chile, em 1969. Bilíngue (mapudungun / castelhano), começou a escrever por volta dos dez anos, por influência de sua avó, Marcelina Pichún, com quem diz ter aprendido tudo sobre a cosmovisão dos Mapuche e sua poesia oral. Também músico e pesquisador, é autor de Canto y Poesía Mapuche (Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes, 2000), Palabras Soñadas – Pewma Dungu (LOM Ediciones, Santiago, 2003), Kogen (Temuco, Del Aire Editores, 2014), entre outros. Foi o primeiro poeta mapuche a receber o Prêmio de Literatura de Santiago, em 1990, com o livro Se Ha Despertado El Ave de Mi Corazón (Editorial Universitaria, 1989).

Josely Vianna Baptista nasceu em Curitiba (PR), em 1957. É poeta, tradutora e escritora. Entre seus livros, estão Ar (1991), Corpografia (1992) e A Concha das Mil Coisas Maravilhosas do Velho Caramujo (2001), Sol Sobre Nuvens (2007), entre outros. Em 1996, criou a coleção Cadernos da Ameríndia, dedicada a temas do repertório cultural e textual de etnias indígenas sul-americanas. É tradutora de escritores hispano-americanos como Augusto Roa Bastos, Lezama Lima, Juan Carlos Onetti, José María Arguedas, Julio Cortázar, Jorge Luis Borges, Severo Sarduy, entre outros. Em 2019, foi lançado a sua tradução crítica do Popol Vuh (Ubu), que ganhou o Prêmio de Tradução da Biblioteca Nacional.

Os dois poemas publicados no Cândido integram Ül: Four Mapuche Poets (Latin American Literary Review Press, 1998), e foram traduzidos a partir da versão original em espanhol. Os originais em mapudungun ilustram a riqueza do idioma dos Mapuche.