POEMAS | Pedro Cassel 30/06/2023 - 10:46
leituras obrigatórias
para diego elias
truffaut lia três novelas por semana
lula traçou mais de quarenta livros
nos 580 dias em que ficou preso
murakami quando termina
de escrever um romance
senta e começa o próximo
enquanto jogamos peteca
homero e joyce umedecem
na mochila esporte
e os livros que queremos escrever
dormem na canga, besuntados
de cenoura & bronze.
*
o poeta faxina
o poeta quer escrever
mas precisa fazer a faxina.
ele se esforça em comparar:
“o poema, como a casa,
precisa ser varrido todos os dias”.
mas isso não é verdade.
“juntar palavras se parece
com empilhar a louça”. blé.
daí ele põe um tecnobrega
e parte pra limpeza,
e tanto eu quanto você
queremos que até o fim
desse poema ele tenha
uma grande epifania,
corra pro caderno, escreva
algo incrível e ponha
de volta na gaveta
como quem bota roupas
no varal, não, como quem
põe grãos de molho, não,
como quem faz uma
conserva de abobrinha.
*
o poeta cochila
dizem que para lembrar dos sonhos
é bom fazer um pacto consigo
antes de dormir: “eu vou lembrar
dos meus sonhos quando acordar”.
e que nos sonhos é impossível
ler ou escrever, porque as letras
ficam embaralhadas e não
fazem sentido. por isso,
sem nenhuma medida
prévia, o poeta cochila.
*
o poeta faz
poeta, do grego: fazedor.
mas hoje é domingo, o tempo
finalmente abriu e o corpo
pede mais que literatura.
então o poeta faz, mas outra coisa:
coloca um caderno na bolsa
e sai de bicicleta,
sem levar caneta.
Pedro Cassel canta, escreve e compõe. É autor das plaquetes de poemas Ilhas e Socorros (Guaipeca Edições, 2017) e dos livros Kiwi (Garupa, 2021) e Se Eu Fosse uma Festa (IEL-RS, 2023). Lançou os álbuns Abrir (2020) e Boca Braba (2022).