Editorial - Cândido 66

A primeira edição de 2017 do Cândido traz um especial sobre o escritor norte-americano Jerome David Salinger (1919-2010), autor que se notabilizou com o romance O apanhador no campo de centeio (1951). O protagonista da longa narrativa, Holden Caulfield, se tornou um espelho para leitores de diversos países pelo fato de expor o desconforto que todos sentem ao serem expulsos da infância rumo às incertezas da vida adulta. A linguagem fluente e coloquial é outro destaque da obra, um clássico literário que se firmou praticamente desde a sua publicação. 

O jornalista Roberto Muggiati assina um ensaio em que comenta o que pode acontecer com o legado de Salinger. O prosador sofreu pelo menos dois traumas envolvendo o cinema [um deles é surpreendente e diz respeito à filha do dramaturgo Eugene O’Neill, Oona O’Neill], jurou que nunca mais venderia um texto para Hollywood e, antes de morrer, proibiu que seus livros fossem transformados em filmes, decisão que pode vir a ser revertida. Muggiati também comenta os relacionamentos emocionais problemáticos e o isolamento do escritor, que fugiu do convívio social em busca de silêncio para escrever.

O ensaio traz detalhes do processo criativo de Salinger. Muggiati conta que o nome do personagem Holden Caulfied, de O apanhador no campo de centeio, pode ter surgido quando o escritor viu uma marquise de cinema anunciando Dear Ruth (1947), estrelado por William Holden e Joan Caulfield. “Acontece que a primeira história figurando Holden, “I’m Crazy”, foi publicada na revista Collier’s em 22 de dezembro de 1945, um ano e meio antes do lançamento do longa. E, antes de pontificar em O apanhador, o personagem aparece ainda com o nome completo de Holden Morrissey Caulfied num conto de dezembro de 1941, o primeiro que Salinger teve aceitado pela prestigiosa New Yorker, “Slight rebellion off madison”. […] E, ainda, num conto de outubro de 1945, na revista Esquire, “This sandwich has no mayonnaise”, Holden Caulfield é dado como desaparecido em ação na guerra”, relata Muggiati, que também comenta como foi a sua “aventura” ao traduzir um texto de Salinger. 

Já o escritor, crítico literário e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Luís Augusto Fischer analisa características da obra de Salinger, um dos poucos autores que o estudioso gaúcho diz reler. Fischer costuma afirmar que Salinger nunca conta uma história, pura e simplesmente, uma vez que o procedimento do escritor oscila entre dois ou três planos, com um empenho descritivo notável — o que pode ser constatado lendo, e relendo, textos dos livros Nove estórias (1953), Franny e Zooey (1961) e Carpinteiros, levantem bem alto a cumeeira (1963). 

Outro destaque do Cândido 66 é a transcrição do bate-papo com o escritor, dramaturgo, ator, roteirista, poeta, compositor e cantor da banda Saco de Ratos, Mário Bortolotto. Londrinense radicado em São Paulo, ele participou de uma edição do projeto “Um Escritor na Biblioteca”, com mediação do jornalista Omar Godoy — o jornal também publica dois contos de Bortolotto. 

Mariana Alves participa da seção Cliques em Curitiba e, no Perfil do Leitor, a trajetória de leitura de Charles Gavin, ex-baterista dos Titãs, atualmente na banda Panamericana e apresentador do programa “O som do vinil”, exibido pelo Canal Brasil. Entre os inéditos, contos de Diego Moraes, poemas da irlandesa Moya Cannon traduzidos por Luci Collin, uma narrativa de Cristiano Castilho e um poema de Antonio Cescatto. 

Boa leitura!