Poesia | Mário Alex Rosa

Felipe Rodrigues
Palavra menor

não tenho fé nenhuma.
Até tentei tê-la quando
por uma insignificância menor
que seu tamanho um poema deu as caras,
e achei que tinha a cara de Deus.
Era apenas um achado, mas achado assim
é tão raro quanto a minha fé.

 

Tinha sentido
Felipe Rodrigues

Era preciso alguma razão
quando naquela noite você
apenas contou algumas estrelas,
passou de uma caneta para um lápis
e escreveu: “elas não são suficientes
Para guardar o amor”.
As palavras já não tinham mais forças,
era apenas uma forma de relembrar
o verão quando caminhamos próximos ao mar,
atravessamos toda a tarde, todas as pedras,
para ouvir agora que aquele doce marulho
tinha sentido.

Felipe Rodrigues

Outro segredo

Tornar a palavra
segredo de algum lugar
não é uma má ideia.

Deixá-la em má companhia
não invalida a mentira
aqui devolvida.

Mas amar o perdido
foi uma solução
um tanto desenvolvida.

 

31 de Dezembro
Felipe Rodrigues

Era para ser o último dia,
daqueles que a meteorologia
avisa que o dia será estável.
Talvez algumas nuvens esparsas
podem cobrir algumas horas
do seu dia. Talvez.
Nada ainda é certo, muito menos
a fenda que separa a manhã da tarde
quando um vento frio já tinha soprado
todos os intervalos do amor.

 

Felipe Rodrigues
Consulta

A anestesia durou pouco,
a veia não está boa. Bate aqui.
Mais forte. Os olhos confundem
o perto e o distante. Deve ser miopia.
Não, doutor, a vista sempre foi boa,
mas de uns tempos pra cá deu pra reclamar
que tudo que chega perto do coração, é selvagem.

 

De uma coleção
Felipe Rodrigues

sempre utilizou as mãos para uso doméstico,
como para cortar carnes, recortar papéis,
apontar lápis até a sua última lasca.
Ultimamente tem sacrificado sua coleção
de lápis de cor com o velho estilete, ainda preciso
para cortes finos.
Os velhos hábitos renderam muitos desastres,
um deles o fez enxergar que o começo
não tem fim, e pôs fim.


Mário Alex Rosa é autor do livro de poesia Ouro Preto e dos infantis ABC Futebol Clube e outros poemas e Formigas. Os poemas publicados pelo Cândido pertencem ao livro inédito SEM ASA. O autor vive em Belo  Horizonte (MG).

Ilustração: Felipe Rodrigues